13 julho 2007

Susana em lágrimas

Acabei de ler o Susana em Lágrimas há dias.
Trata-se de um romance ao estilo Joanne Harris, mas em bom. Ou, pelo menos, menos mau.
Não me parece que seja uma obra «admirável» nem «brilhante» como vem citado na capa do livro como sendo a crítica do Independent.
Também me parece estar um pouco aquém de ser «um esboço de quase todos os aspectos da realidade israelita», como se pode ler na mesma citação.
Não que neste ponto o livro fuja à verdade, até porque não conheço a realidade israelita para afirmar isso, mas parece-me recheado de verdades de La Palisse e que só com muito boa vontade é que podem ser vistas como grandes revelações daquilo que é a sociedade israelita contemporânea. Ou talvez eu estivesse com expectativas altas neste campo e por isso depois me tivesse desiludido um pouco.
… Mas por exemplo: é do conhecimento geral que em Israel existe muita gente um pouco perturbada por ter visto toda a sua família sucumbir ao holocausto. É, não é? E também se sabe que terra era Israel antes de o ser, e quem lá estava antes, não sabe? E também sabemos, ou pelo menos suspeitamos fortemente, que os árabes são todos (…enfim… alguns. Não vamos generalizar) meio apanhados do clima, não sabemos? E também não nos será muito difícil imaginar, dada a sua latitude, que em Israel, no verão, faz um calor de ananases, certo?
É por tudo isto que não senti que o Susana em Lágrimas me ensinasse muito sobre a sociedade israelita.

Alona Kimhi, a autora, tem, porém, quanto a mim, um grande mérito, perante o qual me curvo, que é a razão deste post: Susana. A tal que está permanentemente em lágrimas e que é uma personagem no mínimo insólita. Vulgo cromo. Mas sério.

Conheço uma senhora que, através de uma bactéria, contraiu certa vez um síndroma raríssimo que a deixou às portas da morte e que consiste, grosso modo, em ter as doenças todas de pele que existem, umas a seguir às outras, forte e feio.
Eu acho que a Susana tem isso, mas na versão do foro psicológico. E no caso dela, apesar de não se dever fazer pouco destas coisas,… desculpem… mas acaba por ser hilariante!
Ora leiam:

«Eu [Susana] abracei-a [mãe da Susana] e disse, qual quê, és a pessoa de quem mais gosto no mundo. E senti um cheiro que, apesar de ela ser uma pessoa asseada, era o cheiro a mofo da velhice, e senti também um leve cheiro a fritos e a champô de ovos anticaspa que emanava dos seus cabelos e fiquei cheia de orgulho por ter sido capaz de vencer o nojo.
Uma das coisas que mais me fazem sofrer é o nojo e o ódio que sinto por pessoas de quem gosto.»

Mas há mais! A páginas tantas, ela vai ao teatro, mas está como que um bocadito contrariada. E então faz isto:

«(…), levo a palma da minha mão direita à boca e ferro os dentes com toda a força na carne entre o indicador e o polegar. Fecho o maxilar e começo a morder, Quanto mais me dói, mais mordo.
E subitamente percebo quem sou. Percebo perfeitamente.
Sou uma criatura.
(…)
Cravo os dentes ainda com mais força. Parece-me que começo a sentir o gosto salgado do sangue, (…). Mordo com mais força.
(…)
Em breve tudo isto vai chegar ao fim e na minha boca restará apenas um pedaço de pele e de carne. Uma dentadinha de hamburger em sangue. Engulo-a? Cuspo-a? Acaba de mastigar, Susana, para seres grande e forte.»

No comments…
E a relação da Susana com a cadelita rottweiler do vizinho?
A cadela, que inicialmente Susana julga ser um cão, sempre lhe teve um ódio de morte, ladrando descontroladamente para deixar bem claros os sentimentos que nutria por ela sempre que a via.
Então a Susaninha, um belo dia, quando se depara com a cadela, em vez de se por a milhas como habitualmente, avança para ela, pé ante pé, e faz isto:

«Estava de cócoras como um beduíno em frente do cão. Este ainda lançava uns restos de uivos, e tinha os olhos pretos e brilhantes cravados em mim, com curiosidade. (…)
Eu estava mesmo diante dele. Já nada fazia diferença. Voltei a fechar os olhos. A minha respiração calma cruzou-se com a dele, quente, repugnante. Uma respiração a tresandar a carne. A sensação de nojo era quase agradável. Relaxante. Sensual. Uma coisa húmida e rugosa tocou-me na cara, deslizou por ela, e molhou-a com um líquido pegajoso e fumegante. Abri os olhos. A língua dele de um rosa-arroxeado, lambia-me as faces, os olhos. O queixo. Título do Jornal Ha’aretz: “Uma mulher mantinha relações sexuais com um rottweiler arraçado de Kurtzweiler em Ramat-Gan. Os juízes prolongaram a sua detenção por mais quarenta e oito horas…”»

… Falta dizer que Susana fez isto para impressionar o seu amado, mais uma daquelas pessoas de quem tinha muito nojo, muito nojo, mas que não descansou enquanto não o levou para a cama.

E depois os árabes é que são apanhados do clima…

11 julho 2007

Quem diz a verdade não merece castigo

Pensei que a história do camelo, ou melhor, do deserto estava esquecida. Eu pelo menos esqueci-me... Mas há pessoas que não.
As madalenas ofendidas continuam a reivindicar um pedido de desculpas por parte do ministro das obras públicas, transportes e comunicações. Eu sei... ele foi politicamente incorrecto. Mas disse a verdade, é um facto. Melhor: fugiu-lhe a boca para a verdade. E quem diz a verdade não merece castigo.

A margem sul é cada vez mais um deserto sobretudo no que diz respeito ao emprego, um PEQUENO pormenor que faz dos sítios algo mais que apenas dormitórios. Aliás, é graças a não haver emprego na margem sul que todos os dias milhares de pessoas como eu passam pelo calvário de se deslocarem para Lisboa para trabalhar. O que, além de economicamente dispendioso, é profundamente triste, uma vez que nos rouba horas de vida, essas sem preço.

Concordo, no entanto, que Mário Lino se esqueceu de acrescentar uma ou outra questão às declarações que proferiu. Esqueceu-se, por exemplo, que se a sul do Tejo não se passa nada é porque não só o seu governo como os que lhe antecederam nunca investiram a sério naquela zona do país. E esqueceu-se também, ou nunca lhe passou pela cabeça, que o aeroporto seria uma boa oportunidade para que o deserto deixasse de o ser, proporcionando mais emprego e melhor qualidade de vida a quem lá mora. Qualidade de vida, sim! Conheço algumas pessoas que moram na Portela e não estão surdas nem deprimidas. Conheço outras, porém, em Setúbal, Palmela e arredores, que não levam com o barulho dos aviões, mas que, além de deprimidas, passam fome, porque não têm onde trabalhar.

Como disse antes, o ministro foi politicamente incorrecto e confesso que até acho uma certa piada àquele outdoor do camelo cor-de-rosa.
Mas aos nativos do deserto eu peço: em vez de fazerem birras que não vos vão levar a lado nenhum e de ficarem ofendidinhos com sua excelência (garanto-vos que ele não está muito sensibilizado com isso), façam alguma coisa pela vossa terra que, pelos vistos, tanto prezam, e reivindiquem o aeroporto para a margem sul.

10 julho 2007

Acto egoísta

Este é o meu primeiro post no meu primeiro blog.
Trata-se de mais uma prova evidente entre muitas outras que já tive que jamais podemos dizer “desta água não beberei”.

O meu surgimento neste mundo é também, e acima de tudo, um acto de egoísmo. Eu preciso de escrever. Desde muito miúda (12/13 anos) que sempre que estava lixada com alguma coisa, escrevia sobre o assunto e ficava melhor. Mais tarde, comecei a optar pela nicotina e a curtir a depressão com brutais dores de cabeça que me faziam dormir. Isso era óptimo porque enquanto se dorme não se está em contacto com a realidade.
Agora que deixei de fumar, e à beira de outra depressão (uma excelente fase para escrever coisas perturbadas que os outros acham muito profundas), a vontade de escrever voltou.
…E parecendo que não, agarra menos que o Prozac.